A
dor azul
Adriana
Falcão[i]
A
menina sentia uma dor azul, todos os dias, ali pelas cinco horas da tarde.
Não
era uma dor grandona de puxar o choro pra fora. Era só uma dorzinha. Mas era
bem azulzona.
Achavam
que era maluquice. “Dor não tem cor!”
Mas
como a dor azul não passava, começaram a achar que ela doía mesmo.
Levaram
a menina para todos os médicos do mundo, fizeram todos os exames que existiam,
e ninguém descobriu o que era aquilo. Procuraram então um psicólogo e é claro
que ela achou que aquilo era psicológico.
A
dor azul não queria nem saber. Ia e vinha. Sempre na mesma hora.
As
horas foram passando e o azul da dor continuava colorindo as tardes da menina.
Só as tardes.
De
manhã, ela sentia uma saudade lilás. E à noite um desejo prata ela não sabia de
quê.
A
menina cresceu. E um dia conheceu um rapaz que sentia uma vontade violeta de
espirrar nas manhãs nubladas.
Eles
se gostaram, um gostar laranja que foi se avermelhando sem parar, até que se
casaram, numa noite dourada de alegria, cheia de luzinhas rosas de paixão.
Um
ano depois, numa madrugada de cheiros cor-de-rosa, ela teve uma filhinha. E
nunca ela tinha sentido um carinho tão verde em toda sua vida.
A
filha da menina, quando cresceu, herdou a vontade violeta de espirrar do pai e,
da mãe, o desejo prateado.
A
dor azul nunca mais apareceu.
E
a menina, que já era uma mulher, descobriu que o nome da dor azul, como está no
dicionário, é desassossego.
E
que esse desassossego queria dizer, mais ou menos, em palavras de adulto: “Como
será minha vida daqui pra frente?”.
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