Há
poucos meses li “O Evangelho segundo Jesus Cristo”, de José Saramago. Hoje,
ainda, sinto-me impactada por essa leitura. Mas diria que é um dos melhores
livros que já li. Diria mais: marcou minha vida.
O
texto causa muitos sentimentos contraditórios e até mesmo confusos. Conheço o
Evangelho, por leituras com os mais diversos grupos, em igrejas distintas, em
homilias católicas e sermões protestantes, desde a minha infância, passando por
toda a minha adolescência, até os dias atuais. Sou cristã e tive a experiência
de leitura da Bíblia. Por causa disso, reconheci as passagens a que o livro faz
referência (do começo ao fim, dentro de uma narrativa inédita). Confesso que
muitas vezes senti-me estranha, diferente. O que lia parecia heresia. Paradoxalmente,
a maestria da construção textual é tamanha e a beleza de certos momentos é tão
grande que eu não podia deixar de admirar o autor. E pensar: é doido varrido,
mas é brilhante!
Esse é daqueles livros que se começa a ler e que não se consegue parar. A narrativa é interessante e desejamos saber o que mais vai acontecer, aonde tudo aquilo vai chegar - especialmente para quem tem a referência bíblica. O pensamento é: como o narrador vai agir no momento do acontecimento tal?
E é tão instigante que, ao mesmo tempo que queremos chegar ao final, não desejamos que o livro acabe... Deixar de ter a companhia daquele narrador tão sagaz, às vezes tão duro, tão sarcástico, tão mordaz e tão sensível... Que livro!
Não
sei se recomendo a obra. No entanto, às vezes penso que todas as pessoas deveriam
conhecê-la. A leitura é existencialmente dolorosa. Profunda. Reflexiva.
Dizer que o livro abalou minha fé seria um
exagero Afinal, que fé seria essa?
Mas
é claro que mexeu profundamente com meu modo de enxergar a fé cristã e como ela
se construiu. É
um livro desafiante, com certeza!
Apenas como aperitivo, dois pequenos trechos criados por esse autor ímpar, em seu
modo singular de escrever:
“Ora,
sem que pudesse perceber-se o porquê,
porém as coisas não levam sempre,
conjuntamente, a sua própria explicação (...)”.
“(...)
pois o deserto não é aquilo que vulgarmente se pensa,
deserto é tudo quanto
esteja ausente dos homens,
ainda que não devamos esquecer que não é raro
encontrar
desertos e securas mortais em meio a multidões.”
Saramago é mesmo um dos melhores, Márcia!
ResponderExcluirMandei o texto pra vc, Fernando, porque sei que aprecia.
ExcluirGrande abraço com saudades do seu bom humor e lucidez!
Márcia